EDUARDO COSTA fala sobre
AS VACINAS ANTI-COVID-19 DISPONÍVEIS NO BRASIL
Joyce Enzler entrevista o professor Eduardo de Azeredo Costa da ENSP/FIOCRUZ para a Rede de Escolas de Saúde Pública da América Latina - RESP-AL.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), 214 vacinas estão sendo produzidas no mundo. Dessas, 52 foram testadas em humanos. Enquanto cientistas tentam parar a escalada rápida da Covid-19 no planeta, alguns governantes e empresários só pensam no lucro que as vacinas podem dar materialmente ou eleitoralmente, jogando o conceito de saúde universal com equidade na lata de lixo da História. Passamos por um momento crítico, onde perdemos mais de dois milhões de seres humanos no planeta por causa da Covid-19, porém em um lugar marcado por fome e violência, parece que a maioria da população se acostumou com a necropolítica, naturalizando as mortes que chegam antes da hora, arrastando principalmente idosos, pobres e negros.
Para conversar sobre vacinas, cooperação entre os países ou a falta dela, a Rede de Escolas de Saúde Pública da América Latina (RESP-AL) convidou o epidemiologista Eduardo de Azeredo Costa. Com larga experiência no currículo, foi secretário de Saúde do Governo Leonel Brizola, no Rio de Janeiro, entre 1983 e 1986 e Secretário Nacional de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos em Saúde do Ministério da Saúde 2015/6 no Governo Dilma Rousseff; formado em Medicina; mestre em Saúde Pública pela ENSP/Fiocruz e doutor em epidemiologia pela Universidade de Londres. Eduardo Costa é professor titular aposentado do Departamento de Epidemiologia e Métodos Quantitativos em Saúde da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (DEMQS/ENSP/Fiocruz).
A entrevista consistiu de perguntas respondidas por escrito pelo Professor Eduardo A. Costa em
28/02/2021 para divulgação na RESP-AL.
RESP-AL: P1 - Em qual contexto foram criadas as vacinas contra a Covid-19? Porque elas são confiáveis, mesmo produzidas em tempo recorde?
EDUARDO COSTA: Penso que é importante discutir a primeira parte da pergunta mirando, em particular, sobre o empenho científico pré-COVID-19 para controlar doenças com potencial pandêmico nesse século 21, sem me deter na grande questão política do pós-11 de setembro e consequente alta concentração de esforços para detectar possíveis agentes que poderiam ser usados como armas biológicas. Vou separar minha resposta em duas partes para responder ambas as perguntas:
1.a) A Covid-19 nos reservou várias surpresas bem ruins, especialmente ao demonstrar a vulnerabilidade do controle sanitário frente à destruição ambiental planetária. Mas, algumas circunstâncias e suas características a deixaram mais vulnerável ao controle sanitário. Uma delas foi o fato que nos últimos dezoito anos dois outros coronavirus, antes confinados apenas a animais, saltaram para a transmissão inter-humanos. No primeiro surto, agora chamado de SARS-CoV1 (síndrome respiratória severa aguda por coronavirus, identificado em 2003), foram realizadas muitas pesquisas básicas com esse vírus, porém como tinha baixa infectividade, houve controle apenas com medidas de vigilância epidemiológica.
"Seu código genético foi distribuído para todos os laboratórios importantes do mundo no dia 10 de janeiro de 2020, permitindo precocemente o desenvolvimento de estudos e pesquisas em todo o mundo."
Depois ocorreu a epidemia de MERS-CoV (síndrome respiratória do Oriente Médio por coronavirus, isolado em 2012). Nesse caso, as pesquisas foram realizadas para o desenvolvimento de vacinas. No entanto, não chegaram a ser aplicadas porque a doença também foi controlada com medidas de vigilância sanitária. A isso se somou a reaparição de outro vírus, o Ebola na África, para o qual houve esforços e financiamento internacionais para a produção de vacinas, que também não chegaram a ser usadas, pois houve contenção do vírus apenas com ações de controle a nível comunitário.
Outro fator importante deveu-se à rapidez com que a China detectou o primeiro surto de uma enfermidade aguda respiratória em Wuhan, que ao final dezembro de 2019 foi identificada como causada por um novo coronavirus. Seu código genético foi distribuído para todos os laboratórios importantes do mundo no dia 10 de janeiro de 2020, permitindo precocemente o desenvolvimento de estudos e pesquisas em todo o mundo.
E por fim a identificação da chave do RNA, a estrutura simples do vírus para a penetração nas células, a proteína S de “spike”, permitiu a quase imediata produção de testes diagnósticos e, o melhor, facilidade para buscar uma vacina específica.
A isso é necessário somar que a ameaça causada por esse vírus levou a altos investimentos, mal coordenados, mas que arrecadaram centenas de bilhões de dólares de fundos públicos e de doadores privados visando o desenvolvimento de vacinas.
1.b) A questão da confiabilidade das vacinas é um pouco mais complexa. Essas vacinas, de modo geral, estão sendo aprovadas face à gravidade da epidemia, fazendo com que órgãos reguladores cedam em algumas de suas exigências, por isso alguns caminhos abreviaram seu tempo de aprovação. Todavia, toda essa agilidade é para ser aplicada somente na situação de emergência sanitária em que vivemos. O que é bem razoável, mas exige acompanhamento de efeitos adversos mais cuidadosos na chamada fase IV dos estudos clínicos (pós-comercialização).
No entanto, muitos estudos não permitiram convicções mais amplas, por falhas, algumas sérias, de metodologia utilizada na fase III, ou porque essa foi muito curta. Ou ainda porque seus protocolos não cobriram grupos etários importantes, como poucos idosos e nenhuma criança. Apesar disso, várias vacinas estão sendo administradas e exigidas pelas pessoas e por governos para descomprimirem a tensão política, econômica e sanitária, com forte influência da mídia que serve a interesses de grandes companhias , as quais, apesar de terem investido poucos recursos próprios, exigem lucros fantásticos para sua venda na hora em que são mais necessárias - a lei draconiana da oferta e procura. Sem pudor humanitário.
"Portanto, como não foram feitos estudos para que, com a mesma metodologia, pudéssemos comparar as várias vacinas, estamos submetidos à influência das notícias veiculadas pela empresas que as produzem. A cooperação entre elas foi muito limitada."
Com a emergência, a sociedade fica impossibilitada de escolher melhores vacinas, especialmente em relação a sua reatogenicidade (reação adversa) e a capacidade de neutralizarem as novas variantes, ainda não muito bem definidas, em relação a sua infectividade e gravidade, bem como a sua suscetibilidade à ação da imunidade celular e humoral (anticorpos que circulam para parte líquida do sangue) provocada pelas vacinas já em uso.
De fato, quase todas as vacinas utilizadas visam à neutralização da proteína S. Qualquer variante que não altere a mesma não preocupará. O mais relevante é que a modificação nas mesmas poderá prejudicar a proteção ou inviabilizar a sua penetração celular e o vírus desaparecer quase que por encanto.
No primeiro caso, no qual se inclui a variante de Manaus, em princípio, as vacinas de virus completo tendem ser as que sobreviverão a mutações, mas as demais talvez tenham que alterar seu IFA (princípio ativo) para incorporar novas sequências da proteína S.
Portanto, como não foram feitos estudos para que, com a mesma metodologia, pudéssemos comparar as várias vacinas estamos submetidos à influência das notícias veiculadas pelas empresas que as produzem. A cooperação entre elas foi muito limitada. Prevaleceu assim, a concorrência, competição, especialmente no mundo ocidental. Isso é uma falha monumental da atividade que cabia à OMS.
RESP-AL: P2 - Quais os tipos de vacina à disposição dos vários países?
EDUARDO COSTA: No Quadro I que anexo, estão listadas as vacinas disponíveis. Mas a pergunta admite uma nuance sobre o que é ter ‘à disposição’. Os fatores que as distribuem no mundo estão muito afastados de suas características intrínsecas: e da saúde como um direito universal. Pelo contrário, são decorrentes da força do mercado farmacêutico e de recursos financeiros de países e populações. Tudo funcionando ao contrário do que, desde a Declaração dos Direitos do Homem da ONU, consideramos minimamente justo. Representa um retrato do neoliberalismo atuando sobre países e instituições internacionais há três décadas.
QUADRO I - COMPARAÇÃO ENTRE AS VACINAS PARA A COVID-19*
RESP-AL: P3 - No Brasil, quais as vacinas disponíveis? Qual a mais eficaz e que apresenta menos reação alérgica?
EDUARDO COSTA: Vou dividir em três a resposta a essa questão, pois, apesar de só termos duas disponíveis no momento, há iniciativas para inclusão de outras:
3.a) No momento temos duas vacinas disponíveis no Brasil. Uma resultante da iniciativa do Instituto Butantan do Estado de São Paulo de efetivar acordo preliminar com a empresa Sinovac da China, anunciada em 11 de junho de 2020 pelo Governador João Dória, e outra da Fiocruz, com o apoio do Governo Federal, anunciada em 26 de junho de 2020 com a empresa AstraZeneca da Inglaterra/Suécia. Houve previsão de transferência tecnológica e produção nacional para as duas.
Até o momento, temos apenas a vacina do Butantan sendo utilizada, já que a da Fiocruz, por não recebimento dos insumos previstos, está importando a do Serum Institute da Índia, também em acordo com a AstraZeneca, porém a principal diferença é produzir internamente a matéria-prima, desde o início, sem depender do envio da empresa.
O preço da dose da vacina AZ/Fiocruz foi de 3,20 dólares, sendo que os primeiros 30 milhões de doses foram pagos adiantados, ainda em 2020. Essas condições se mantêm para outros 70 milhões de doses previamente contratados (não reembolsáveis por desistência ou fracasso). E as doses que estão sendo importadas, são pagas separadamente a preço superior a cinco dólares por dose ao Serum Institute.
O que parece claro é que a produção de IFA prevista para ser feita na Bélgica fracassou, e a deslocada para a China não cobre o total contratado no mundo, provocando o atraso no início da produção da Fiocruz. Note-se que esta não têm direito à exportação da vacina da AstraZeneca para os países latino-americanos, enquanto o Butantan/SP assegurou essa atividade para a Coronavac.
No México, foi formado um consórcio, entre a fundação do empresário mexicano Carlos Slim, a farmacêutica AstraZeneca para produzir o IFA na Argentina – sendo a formulação final e envase feito em laboratório mexicano – para fornecer aos demais países latino-americanos, exceto o Brasil. O preço final ficará entre três e quatro dólares, estando prevista para esse ano a produção de 150 a 250 milhões de doses.
"... Governo Federal, que está também sobre pressão popular e midiática por mais vacinas e mais agilidade no processo, dado o recrudescimento epidêmico e a crise econômica e social que o Brasil atravessa."
3.b) Há no entanto vacinas que agora estão sendo aprovadas para uso no Brasil pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de forma bastante flexível, depois de uma tentativa frustrada de tentar complicar a aprovação da Coronavac do Butantan. Entre elas, estão a Sputnik V desenvolvida pelo Instituto Gamaleya, da Rússia; a Covaxin da empresa Bharat Biotech da Índia (preço de 15 dólares por dose) e uma pressão grande da Pfizer (17 dólares por dose) e da Johnson para que sejam adquiridas pelo Governo Federal, que está também sobre pressão popular e midiática por mais vacinas e mais agilidade no processo, dado o recrudescimento epidêmico e a crise econômica e social que o Brasil atravessa. Todas elas estão citadas no Quadro anexo.
"Para entender como isso influencia o resultado é preciso ter em mente que a inclusão de sintomas pouquíssimo associados ou não à infecção pelo SARS-CoV-2 não só aumenta a detecção de casos em vacinados, como em não vacinados."
3.c) Mas, a sua pergunta se referia também à comparação entre essas duas vacinas em uso no Brasil, com respeito a eficácia e reações adversas. É difícil responder baseando-se apenas nos resultados dos ensaios clínicos com essas vacinas.
Os estudos foram diferentes em muitos aspectos, mas para a eficácia a questão principal é que o “screening” (rastreamento), para os casos que viessem a acontecer nos grupos vacinados e controles, tinha definição muito diferente. No estudo da AstraZeneca, no Brasil e Reino Unido, as pessoas a serem testadas tinham de apresentar um de quatro sintomas, febre (pelo menos 37,8 C), tosse, fôlego curto e perda de cheiro ou paladar. No do Butantan, no Brasil, além destes, eram testados também os que apresentassem outros sintomas inclusive vômitos e diarreia.
Para entender como isso influencia o resultado é preciso ter em mente que a inclusão de sintomas pouquíssimo associados ou não associados à infecção pelo SARS-CoV-2 não só aumenta a detecção de casos em vacinados, como em não vacinados (que sem eles no screnning seriam assintomáticos não detectados), diminuindo a eficácia medida da vacina (como pode-se inferir de como se constrói o risco relativo).
Adicionalmente o que ocorre é melhor entendido com a visão de que a imunização produz um “shift” (deslocamento) da distribuição de casos segundo sua gravidade (pode-se usar a classificação de casos da OMS). Assim, se ela não é 100% eficaz, inclusive para formas assintomáticas (como em geral as vacinas não são), uma parte dos casos que seriam graves ou moderados tornam-se leves; os leves, levíssimos e os levíssimos, assintomáticos. Deste modo, em consequência, os resultados informados à Anvisa pelo Butantan mostram um gradiente de eficácia interessante: 100% (não significante pelo pequeno número de ocorrências) para casos moderados e graves – que precisam hospitalização. 78% (significante) para casos leves, moderados ou graves, que procuram atenção médica, e 50% para os levíssimos, que não requerem atenção médica.
Em relação à essa vacina, tem sido apontado que a resposta imunogênica é mais baixa do que a das vacinas baseadas só na proteina S. Isto não surpreende muito em função de que os antígenos usados nos testes procuram detectar os anticorpos apenas para a proteína S e a vantagem das vacinas completas seria a de ampliar o espectro imunogênico.
Já a análise da eficácia da vacina da Astrazeneca é muito mais complicada devido às abusivas mudanças em seu protocolo (em depoimento, voluntária disse que precisou assinar múltiplos consentimentos toda vez que havia uma alteração nos procedimentos) e comparações claramente inadequadas na análise estatística, não previstas nos protocolos.
Se eu fosse contrastar as duas vacinas do modo que me parece mais comparável, a vacina da AstraZeneca teria 62% de eficácia (duas doses completas como era o protocolo correto) para casos leves, moderados e graves e 90% para casos moderados e graves. Não é uma grande diferença, porque estruturalmente ambas têm o mesmo antígeno: a proteína S, ainda que possuam outros componentes diferentes – proteínas do vetor no caso da Astrazeneca e proteínas do próprio coronavírus da Butantan/Sinovac. E nessas está a mais provável diferença na reatogenicidade.
De qualquer modo, é difícil comparar a reatogenicidade das duas frente ao protocolo dos estudos, em especial, na questão dos controles. Esse grupo, chamado controle no ensaio clínico, na vacina do Butantan, foi injetado com uma solução de alúmen, na concentração que é adicionada à vacina para sua composição final. A razão dessa decisão é que o alúmen costuma tornar a vacina mais dolorida ao injetar. Assim, o voluntário não desconfia se tomou o medicamento ou o placebo, isto significa que a situação cega é mantida. No entanto, no caso das AstraZeneca, além de terem acrescentado no protocolo o uso de paracetamol na vacinação, não é fácil entender porque o grupo controle foi vacinado com a anti-meningocócica conjugada A, C, W e Y.
Essa vacina tem reatogenicidade alta em adultos. Daí não surpreender que os números de reações graves tenham sido quase iguais entre os dois grupos de comparação. E mesmo assim esse estudo foi pausado três vezes em função de reações muito graves, a ponto de o FDA, órgão americano equivalente à Anvisa, não autorizar a continuação do estudo nos Estados Unidos.
Portanto, não surpreenderá se essa vacina apresentar algumas situações muito graves, como foi noticiado que ocorreu em Manaus. Isso pode estar associado ao estranhamento com sequências proteicas do vetor remanescentes na vacina (adenovírus de chimpanzé). Se assim for, será mais frequente na segunda dose, todavia ainda tolerável coletivamente dada a gravidade da Covid-19.
Em resumo, parece que a AstraZeneca, talvez confiante na marca Oxford de seu antígeno, cuidou mais dos negócios e aspectos jurídicos do que da qualidade de seus estudos clínicos, sacrificados por querer ganhar tempo e se adiantar a outras. Também se descuidou de seus aspectos industriais, procurando localizar agora justificativas técnicas para aumentar o intervalo entre as doses.
Ambas, no entanto, estão sendo igualmente úteis nesse início de combate à Covid-19 no Brasil. Esperamos em breve poder medir o impacto que estão produzindo. Porém, não me furto a dizer que devíamos ter concentrado o uso da Coronavac nos idosos, porque temos a evidência de que é menos reatogênica e de eficácia melhor demonstrada nos estudos de fase III.
"Ambas, no entanto, estão sendo igualmente úteis nesse início de combate à Covid-19 no Brasil. Esperamos em breve poder medir o impacto que estão produzindo"
RESP-AL: P4 - O Plano Nacional de Imunização contra a Covid-19 não poderia ser mais uniforme, como ter uma única vacina, a que fosse menos reatogênica?
EDUARDO COSTA: A pergunta é interessante. Com a capacidade produtiva do Butantan, da Fiocruz e de alguns laboratórios públicos e privados seria possível concentrar a produção na Coronavac, por exemplo, que tem tecnologia mais simples e historicamente sedimentada, mas os conflitos que o governo federal brasileiro estimula e alimenta tornaram essa possibilidade impossível, inviável. Do mesmo modo, as iniciativas de estudos clínicos no país de várias vacinas candidatas estrangeiras não foram suficientes para que as instituições, com densidade epidemiológica e sanitária brasileira, sugerissem estudos comparativos entre tais vacinas para saber quais as melhores e mais acessíveis.
"Não estamos mais integrados aos vizinhos do continente nessa pandemia, principalmente pela onda direitista e golpista que assolou a região nesses anos de gestão Trump, e acabou com a União de Nações Sul- Americanas(Unasul).
RESP-AL: P5 - Os países da América Latina e do Caribe estão atrasados na vacinação da população, com exceção de Cuba, que está produzindo localmente. Além da falta de recursos, quais os problemas que você identifica? Acha viável uma maior cooperação entre eles?
EDUARDO COSTA: A vacina de Cuba, Soberana 2, está iniciando agora sua fase clínica III, ou seja, ainda não iniciou a vacinação geral. A sua capacidade produtiva divulgada seria na ordem de 100 milhões de doses, muito mais do que Cuba precisa. Seria muito oportuno um estudo comparando a Coronavac e a Soberana 2, no Brasil, pois poderia dispensar o uso de controles não vacinados.
A Argentina e a Venezuela estão apostando também na vacina russa, a SputnikV. E já falamos do arranjo da AstraZeneca com países latino-americanos. Não estamos mais integrados aos vizinhos do continente nessa pandemia, principalmente pela onda direitista e golpista que assolou a região nesses anos de gestão Trump, que acabou com a União de Nações Sul-Americanas (Unasul).
Além disso, o Brasil, em especial, se tornou um desastre em suas relações na região. Percebo agora uma integração maior periférica em processo, especialmente depois da derrota de Trump e da vitória de forças democráticas na Bolívia e Equador. Na área da saúde, algumas boas iniciativas podem avançar mais. Além da situação econômica e social de nossos países, as derrotas sanitárias nos unem e acabam com arrogâncias e professorialismo. O ambiente deve ficar melhor se quisermos avançar na luta comum dos povos latino-americanos contra o imperialismo econômico e cultural.
RESP-AL: P6 - O Instituto Butantan completou 120 anos em 23 de fevereiro e a Fiocruz completará 121 anos em 25 de maio. O Brasil comprovou que tem expertise, competência e seriedade na área científica. Por que não há o investimento governamental necessário? A sociedade tem percepção disso?
EDUARDO COSTA: Não sou um científico-ufanista brasileiro nos tempos atuais. Ainda que reconheça nossas possibilidades e avanços setoriais. Nosso desenvolvimento científico ficou muito mais dependente depois de 1964. E, a partir de 1990, o país jogou fora sua memória e se preparou para o neoliberalismo, adotando tudo que azeitaria as novas práticas.
Há 30 anos, o Brasil desindustrializa-se e portanto não há onde inovar para o consumo de massa que precisamos. Vivemos do agronegócio e da atividade extrativa e achamos mais fácil importar quase tudo, porque temos superavit comercial. Estamos desmontando e vendendo em fatias a Petrobrás, demonstração histórica da capacidade científica e tecnológica brasileira. E principalmente nos lixamos para a educação. Somos um dos poucos países do mundo que gastam mais em saúde do que educação, por exemplo. Na pandemia, fechamos as escolas dos pobres e abrimos os shoppings dos ricos.
Entrevista de 28/02/2021.
Revisão para edição de 06/03/2021.
Eduardo de Azeredo Costa – edu.costa@live.com
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