quinta-feira, 27 de novembro de 2014

CENTENÁRIO DE RUBENS MENA BARRETO COSTA

Uma homenagem 


Meu pai, Rubens Mena Barreto Costa, nasceu no dia 27 de novembro de 1914, em Porto Alegre; hoje completaria 100 anos de existência, não tivesse falecido em junho de 1992. Filho de Cantalício Luis da Costa e Hermelinda Menna Barreto Costa.

Não teve uma vida que passou desapercebida pela comunidade onde cresceu. De fato, muito cedo, ainda como estudante e como médico, daria passos importantes que marcaram seu pioneirismo e sucesso profissional. Do mesmo modo, construiu sua família, casando aos 27 anos com Lygia Bossle de Azeredo, nascida em 14 de abril de 1921 em São Francisco de Paula – RS. Dos três irmãos, Francisco, Margarida e eu, restamos dois com a perda da única e querida irmã.

Como filho, vejo a página em que escrevo como um vasto leito branco impreenchível para falar de nosso pai como figura humana, como pai. Mas meus inúmeros colegas que o conheceram não me perdoariam se não desse hoje uns poucos dados do seu “curriculum” - alguns estão registrados no livro “50 anos desta Noite” (Ed. Nitpress), que publiquei em 2011.

Morou na cidade de Rio Grande na sua juventude onde concluiu o segundo grau, indo estudar em Porto Alegre, na Faculdade de Medicina da URGS, formando-se em dezembro de 1940 (casaria no dia 04 de janeiro de 1941). Viveu nesses anos a luta da esquerda contra o fascismo no Brasil, ao tempo em que, além de estudar, tinha de fazer sua subsistência como professor de Biologia, primeiro na Escola Técnica de Agronomia (onde teve Brizola como aluno) e logo no Colégio Estadual Júlio de Castilhos (onde eu cursaria o colegial).

Ainda estudante, publicaria um livro, em 1940, com a co-autoria de Joaquina Muniz Reis: Alimentação e Saúde: Guia Prático de Alimentação Racional (Ed. Livraria do Globo). Naturalmente, à época, foi abrindo o campo da endocrinologia e nutrição, como especialidade médica, mas com base clínica geral – a Medicina Interna de então. A pretensão de especializar-se nos Estados Unidos caiu, quando não obteve visto por suas atividades politico-estudantis.

Como professor e médico acumulava dois cargos estaduais; assim, após formado, se tornou clínico do hospital psiquiátrico São Pedro e como professor foi lotado na Secretaria de Educação para organizar a alimentação escolar, onde também fazia pesquisas sobre as condições nutricionais dos escolares. Ao mesmo tempo, trabalhava voluntariamente, o que era visto como retribuição comunitária, no serviço chefiado por Rubem Maciel na Santa Casa, que recebia os estudantes da Faculdade também.

Corpo clínico na Santa Casa. Sentados: Drs. Nedel, Terra,
Rubem Maciel,Mena Barreto e Pereira Lima.
(Foto publicada na Zero Hora em 2013
por ocasião do centenário de Rubem Maciel.)
A ascensão profissional foi meteórica e em poucos anos sua clínica particular “bombava”: tornou-se um “medalhão”. Lembro de menino ir ao seu consultório com a sala de espera sempre lotada, sendo frequente que começando às 14 horas só terminasse de atender às 21 horas, indo depois às visitas domiciliares.

Mas, minha memória mais vívida era das aulas que dava para as professoras da rede estadual - assisti a algumas na década de 50. Nelas sempre tinha a parte prática de preparo de refeições e pratos especiais com uso de soja como reforço proteico. Ensinava a fazer leite de soja, com máquinas rudimentares de moer carne, adicionando sabores, e/ou misturava o leite ou farelo em bolos e outros pratos dos lanches, que exigiam o acompanhamento com uma fruta fresca.

Simpatizante do Partido Comunista Brasileiro, contribuía financeiramente e distribuía cédulas dos seus candidatos nas eleições (assim comecei na política). Em nossa casa recebíamos a visita de vários comunistas de destaque (me permito citar apenas um: Delcy Silveira, combatente na Guerra Civil Espanhola) e já aos quatro anos de idade eu era levado pela mão para assistir a comício de Luis Carlos Prestes.

Na década de 60, meu pai foi convidado a ministrar a cadeira de endocrinologia e nutrição da faculdade católica de medicina que eu também começaria a cursar. Ali o conheci, para além da clínica, como um visionário da saúde pública, que denunciava e dava os caminhos para acabar com a fome e a desnutrição no mundo.

Em 1960 escreveria um ensaio sobre “Alimentação e Liberdade” publicado no livro Rio Grande do Sul: Terra e Povo (ed. Livraria do Globo, 1964). E logo prepararia para nosso curso a monografia: Aspectos da Nutrição Humana no Rio Grande do Sul, 1965. No biênio 1964-66 seria o vice-presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Nutrição, sendo seu colega Henry Wolf o presidente.

Os conhecimentos que fez como médico, que incluíam desde Maneco Vargas até o Arcebispo de Porto Alegre, me livraram de maiores represálias a partir de 1964. Quando eu optei pela Saúde Pública, me apoiou dizendo que era seu sonho também.

Ao deixar o Rio Grande, em 1967, me afastei do cotidiano do meu pai e da minha grande família gaúcha, mas a presença dele, como de todos, quisesse ou não, se impunha. Aqui no Rio, todos endocrinologistas, inclusive Fernando Ubatuba, um dos cassados de Manguinhos, o conheciam, e encontrei um admirador seu que me ensinou bastante sobre meu pai: Luis César Póvoa, nosso amigo falecido recentemente.

Na sua casa trilharam muitos nomes da redemocratização brasileira a partir de 1979, no centro delas Brizola; Teotônio Villela, entre outros por lá passaram.


Já secretário de saúde no Rio, invariavelmente minhas atividades com Brizola começavam com: “Como vai o Professor Mena Barreto?” ou “Como vão os velhos?” mais informalmente. O programa de alimentação dos escolares no Rio de Janeiro de Brizola e Darcy tinha a sua chancela: o apoio que deu para o retorno de Brizola do exílio teve dele o reconhecimento na forma de implementar a alimentação nos CIEPs. 

Luiz Varo Duarte, em Fome no Sul, Mito ou Realidade, de 1985, disse: "...todos os projetos de programas nutricionais em prol da criança hoje propostos já estavam equacionados há mais de 40 anos pelo Professor Mena Barreto."

Não por menos, recebeu, ainda em vida, do prefeito Alceu Collares o título de cidadão porto-alegrense.

Meu pai e minha mãe na descontração de uma festa.
A nossa grande família gaúcha nutre até hoje verdadeira reverência pela memória do meu pai. A todos, como médico e como amigo, muitas vezes conselheiro afetivo, atendia no consultório, em casa ou em suas casas. Nossa casa, com minha mãe acolhia parentes e amigos por períodos curtos ou longos, com a típica hospitalidade gaúcha, e muita alegria.

Com a doença de minha mãe e sua morte, em 1988, que sacudiu como um terremoto todos nós, sua saúde também foi abalada.

Nos seus últimos dias, num CTI, pensei, como penso até hoje, o quanto deixei de aproveitar seu convívio, seus conselhos, seus conhecimentos, seus pensamentos mais amadurecidos. 

Nos deixou mais do que bens, ou um belo exemplo: a sensação de insuficiência para poder alcançar e trilhar a vida de doação pessoal e humildade que balizaram sua vida. Mas também a certeza de se saber o que há que se fazer nesse mundo.

Rio de Janeiro, 27 de novembro de 2014.

Eduardo de Azeredo Costa

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

A MORTE DE GETÚLIO 60 ANOS DEPOIS



Beth Carvalho e José Augusto Ribeiro na Livraria da Travessa
 em 24 de agosto de 2014.
No dia de ontem, 24 de agosto de 2014,  tivemos o privilégio de ouvir e debater com José Augusto Ribeiro a contribuição da Era Vargas para o Brasil.

Foi uma oportunidade ímpar usufruir do fantástico conhecimento de Zé Augusto sobre a política brasileira e mundial no século passado. Misturo aqui umas reflexões pessoais com as que ouvimos.


O SUICÍDIO

Não é possível para um médico passar pela morte por suicídio sem falar sobre ciclos depressivos que abatem pessoas e a humanidade. Mas, apesar das notas jornalísticas e pareceres de pseudo-historiadores que querem associar isso, no caso de Getúlio, não tem nada a ver. 

O suicídio pela tristeza e isolamento com a crise política que atravessava, ou sua índole manifesta em outras ocasiões, como a de que se fracassasse a revolução de 30 ele não se deixaria prender - preferiria a morte, não voltaria derrotado, não estão no campo médico.  

Ora, isso não é depressão, é cultura. Pertence ao campo antropológico e sociológico.

Getúlio evidentemente deveria estar mais reflexivo e, porque não?, abatido, frente à campanha desenvolvida por Lacerda, possivelmente estimulada pela CIA, depois da criação da Petrobras (já havia acontecido a intervenção da CIA/EEUU na Guatemala e no Irã). E a longa vida o fazia reconhecer que não se movia mais tanto por “instintos“; - é a contribuição da idade. Isso é absolutamente normal, só alguém com grave perturbação mental não sentiria o peso da campanha contra ele. Ele tinha a opção política da renúncia ou da resistência até armada. Resolveu pela última preservando a honra e uma fratura que pudesse desaguar na privatização dos recursos naturais brasileiros. O texto da carta-testamento é suficientemente claro sobre isso.


Nada pior do que morrer em vida e, como diria jocosamente um tio meu, gaúcho também, preferia a morte a morrer sem honra, humilhado.  Ora, esse é o tipo de suicídio imposto socialmente, é o que obrigava o comandante do navio que afunda a não deixar o barco e os comandantes militares derrotados a se suicidar ou fazer harakiri. Nada a ver com depressão. Suicidar-se ou correr (contribuir) para a própria morte para salvar a honra não cabe nessas categorias estritamente psicológicas. No campo político não são tão raros os casos com um sentido de legado. O de Getúlio e o de Allende, certamente são emblemáticos na história latino-americana.

Sempre lembro do dia que um amigo, Carlos Araújo, me perguntou se eu poderia conseguir cianureto de boa qualidade. O pessoal do fronte na luta contra a ditadura tinha feito umas cápsulas para que pudessem se suicidar, se presos; um deles mordeu, mas não morreu – teve uma diarréia! Ora, não era em princípio para evitar o terror da tortura a que eram submetidos: era que não queriam falar e acabar contribuindo para que outros companheiros fossem presos. Aliás, ele mesmo, mais tarde, para não falar, tentaria o suicídio se atirando embaixo de um veículo em plena Avenida São João. Numa perspectiva, eram suicídios heróicos ou como bem classificou Durkheim, suicídios altruístas (O Suicídio, 1897).


DISCURSO DE OSWALDO ARANHA

Foi assim que Oswaldo Aranha, o companheiro de jornada de Getúlio, desde 1930, entendeu seu suicídio. Considero que um trecho de seu discurso no sepultamento é o mais acabado sentido que hoje, 60 anos depois, concebemos para o ato de Getúlio, naquela manhã de agosto (in Helio Silva, 1954 – LPM, 2004).

“... tenho consciência e devo dizer a todos e a todo o País, que tu morreste para que nós, os que te assistiam, os teus amigos, não morressem contigo. Devo declarar que, se assim vivemos, é porque tu te antecipaste na morte, para nos deixar na vida. O teu suicídio é o grande suicídio, o suicídio altruísta, aquele que faz a mãe, e do pai para o filho, e foste pai e filho como ninguém, e por isto soubeste fazer pelos teus. Ninguém mais do que eu o pode testemunhar. Todos os meus apelos eram no sentido de que a tua vida era da maior necessidade para o Brasil.
(...)
... Quando quiserem escrever a História do Brasil, queiram ou não, tem-se de molhar a pena  no sangue do Rio Grande do Sul, e ainda hoje, quem quiser escrever e descrever o futuro do Brasil, terá de molhar a pena no sangue do teu coração.
(...)
Quando há vinte e tantos anos, assumiste o governo deste País, o Brasil era uma terra parada, onde tudo era natural e simples; não conhecia nem o progresso, nem as leis da solidariedade entre as classes, não se conhecia as grandes iniciativas, não se conhecia o Brasil. Nós o amávamos de uma forma estranha e genérica, sem consciência de nossa realidade. Tu entreabriste para o Brasil a consciência das coisas, a realidade dos problemas, a perspectiva de nossos destinos. Ao primeiro relance, viste que a grande maioria dos brasileiros estava à margem, e a outra parte a serviço das explorações estrangeiras.”





GETÚLIO VIVE

Getúlio vive e viverá mais que tudo pelo regime de garantia dos direitos do trabalho no Brasil e por suas decisões estratégicas para o desenvolvimento do Brasil, tendo tomado partido de um nacionalismo – decorrente da história colonial brasileira – anti-imperialista, pois, com opção estatal, no conflito com os interesses privados. Getúlio sabia que privatização da economia significava desnacionalização e fraudes.

Ao criar a Petrobras estatal, teve de criar um novo marco na administração pública que chamamos de “empresa estatal”.  Até hoje a luta dos privativistas é acabar com esse tipo de estrutura legal. Se é fantasioso para usar para o setor social, sendo apenas expediente para terceirizar, privatizando os recursos públicos, é indispensável para o setor produtivo estatal. Inconcebível se mover e se tornar eficiente com a parafernália legal feita para que o setor público típico não funcione com eficiência.


O LIVRO – A ERA VARGAS

Não cabe aqui um artigo longo sobre o legado de Getúlio, mas para encerrar cabe dizer a partir do exemplo anterior: não há o que se possa analisar que ocorra hoje que não tenha sido antes desafio e soluções colocados na Era Vargas. Mas nesses 60 anos querem fazer diferente, renegando sua contribuição e, por isso, tropeçando nela.

Nosso desafio é fazer os jovens conhecerem o legado da Era Vargas, para calar mentiras e manipulações dos que tentaram e tentam impedir o desenvolvimento autônomo do Brasil, com justiça social.

Encare o livro de José Augusto Ribeiro (não esse livro encomendado ao Lira que, para fazer um livro “neutro” esconde as outras versões de episódios importantes de nossa história.) Nele você vai entender melhor desde o império a história brasileira. Vai entender a revolução de 30 e a contra-revolução de São Paulo, nas suas origens: o ideário do Partido Republicano sobre o movimento operário.

Presidentes Getúlio e Roosevelt alinhados em 1936.
Entender a Revolução de 30 e o golpe de 37 precisa se colocar naquele tempo: a crise 29. Revoluções sociais ocorreram em vários países latino-americanos, inclusive México, Cuba, Nicarágua. Nos países que os revolucionários entregaram o poder para os “liberais democratas” virariam logo adiante ditaduras de direita, submissas aos Estados Unidos. Getúlio consegue manter o projeto de autonomia.

No livro do Zé Augusto, você vai conhecer verdades mascaradas tanto pelos integralistas como pelos comunistas, sobre o caráter “fascista” de Getúlio, ou seu “em–cima-do-murismo”. A um tempo em que Chamberlain fazia um acordo com a Alemanha e a União Soviética dividia a Polônia com Hitler, paradoxalmente, em 1938, o Brasil expulsava o embaixador alemão. A verdade sobre o caso Olga Benário aparece límpida – a decisão do Supremo – era 1936 e a ditadura do Estado Novo é de 1937. As olimpíadas da Alemanha foram nesse ano e disputadas pelos atletas de todo o mundo. O Partido Nazista era enfraquecido pelo próprio Hitler. 

Você se surpreenderá e deixará de ser como eu, antes de lê-lo, um mero aparelho repetidor de sandices inventadas para tapar os erros políticos de correntes políticas de então.






Eduardo Costa, 25 de agosto de 2014.


terça-feira, 12 de agosto de 2014

CONVOCAÇÃO BRIZOLISTA

Dez anos se passaram desde a morte de LEONEL BRIZOLA. 

(Com agradecimentos ao Chico, dialogamos:)
                Getúlio:– Mas que tal!
                Brizola:- Deixei uma gurizada na trilha!
                Jango:- Boa, Leonel!

Brizola em vida tornou-se uma referência marcante por sua trajetória de credibilidade, honradez e coragem para o "povão", assim como também o político mais temido e, por isso, mais perseguido pelas elites brasileiras, desde 1961, quando liderou a campanha da legalidade. O reconhecimento de sua importância histórica, de qualquer modo, só cresceu desde que nos deixou.


A HERANÇA BRIZOLISTA


Nessa conjuntura política em que os partidos não respondem mais aos anseios populares, e a própria ideologia que dizem professar entregou-se ao pragmatismo eleitoral e reduziu-se a servir a interesses privados, inclusive estrangeiros, precisamos nos guiar por exemplos, mais do que por discursos. 

Nessas eleições de 2014, aqui no Rio de Janeiro, a maioria dos candidatos busca os eleitores brizolistas e tem usado seu legado de formas variadas. Uma parte, aboletada no PDT, assume direitos que não tem sobre sua história e até a envergonham. A nova diáspora trabalhista-brizolista, imposta pela executiva nacional do PDT, levou muitos companheiros da vida política de Brizola no Rio de Janeiro a se abrigarem em outras legendas, favorecendo a disseminação de suas idéias e projetos para plataformas eleitorais diversas.

Leonel Brizola visitando um CIEP.
Isso poderia significar que enfim se valoriza a figura ímpar de Brizola e que facilita a execução de programas propostos por ele, pois não haverá o combate aberto que vários partidos desenvolveram contra os seus governos no Rio de Janeiro. Mas serve também para desestruturar seu pensamento sistemático e uma prática política coerente como a que professava e agia. Brizola em vida já alertava: “- Eduardo, querem o brizolismo sem Brizola!” E digo eu hoje: - e gostam do PDT sem Brizola!

Nosso combate por melhores dias para nosso povo só pode partir, nesse momento, do encontro de duas vertentes, uma histórica, entender o trabalhismo brasileiro como a luta pela soberania, contra a espoliação econômica, ou “as perdas internacionais”, e a outra, a própria prática brizolista no governo em sintonia com os anseios populares por melhores condições de vida e trabalho, como uma única só coisa com duas pernas na caminhada ao socialismo, pelo “socialismo moreno” brasileiro. 

Qual o nosso desafio, nessa eleição, portanto? Marchar para a direita, para se vingar de episódios rasteiros? Esquecer qual o objetivo da política? Deixar os trabalhadores à mercê de oportunistas do dia? Discuti isso tudo nesses dias com BRIZOLA Neto e pensamos que não.


A TRAJETÓRIA DE BRIZOLA NETO



Brizola Neto
O jovem Brizola Neto conseguiu sobreviver às tentativas de desmoralização do seu nome de família e de usurpação do mesmo em sua trajetória política, que partiam desse PDT medíocre que aí está. Entende ele perfeitamente o casamento necessário do pensamento e prática de Brizola. Conviveu com Brizola na fase de seus pensamentos conclusivos, e em parte dos necessários embates políticos. 

Depois de ser um jovem secretário pessoal de Brizola, foi vereador, deputado federal, líder do PDT na Câmara Federal, e Ministro do Trabalho e Emprego. Em todos os seus mandatos seguiu na prática seus ensinamentos, defendendo os princípios que ele defendia desde quando, como estudante, tornou-se fundador do partido trabalhista brasileiro. A carta-testamento de Getúlio Vargas é também seu ideário.

Já quando vereador se empenharia na defesa das comunidades contra as remoções arbitrárias para as obras do Panamericano no Rio e conseguiria a inclusão na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de recursos para que os CIEPs municipais voltassem a funcionar em tempo integral.

No meio de uma bancada de ruralistas, homens de negócios, conservadores e simples oportunistas, com poucas exceções, não se encontrava ambiente para nada mais além do que pressionar o governo por vantagens para seus projetos eleitorais pessoais; Brizola Neto, deputado federal, conseguiu romper o isolamento ideológico com o seu blog – o Tijolaço, acabando por consolidar-se como líder do partido.

No seu mandato promoveu as articulações para a aprovar a lei do salário-mínimo que o reajusta anualmente com índice superior ao da inflação e não permitiu que se concretizasse uma proposta de “Reforma Trabalhista Patronal”, como queriam amplos setores do próprio PT. No campo da economia não apenas usou seu voto de líder em defesa do novo marco regulatório do petróleo, que garantiu que a Petrobrás fosse a única operadora da exploração do pré-sal, como propôs e articulou um marco regulatório semelhante para o setor mineral, derrotado, no Congresso. No campo do meio ambiente, votou contra a proposta do governo do Código Florestal e fez a denúncia pública das ações da Chevron que poluia nossa costa atlântica, não adotando as normas nacionais de segurança e prevenção.

Ocupar a pasta de Ministro do Trabalho, aos 34 anos, por apenas 10 meses, teve um papel especial na sua trajetória política. Ocupou um ministério criado por Getúlio Vargas para instituir o regime de garantias dos direitos dos trabalhadores, e por ter sido ocupada por João Goulart, também aos 34 anos, que se tornaria o Presidente das Reformas de Base. A herança histórica de Getúlio e Jango, e, particularmente, o exemplo de Brizola, não permitiriam que aceitasse as más práticas dos que faziam negócios com repasses fraudulentos a ONGs e com a autorização de funcionamento de sindicatos, maculando a nossa tradição trabalhista. 

Na sua curta gestão não permitiu que se aviltassem as conquistas dos trabalhadores e contribuiu decisivamente para a aprovação da PEC do trabalho escravo, além de valorizar, como fizemos juntos, a saúde do trabalhador. Inesquecível lembrar a surpresa de uma platéia atenta no Supremo Tribunal Federal, quando, designado por ele, atropelando as indicações “técnicas” habituais, parti de Getúlio Vargas, passando por Jango, e anunciei que o Ministério do Trabalho de Brizola Neto saia do terreno das ambigüidades, para enfrentar a multinacional associada à exploração, industrialização e comercialização do amianto. Da platéia os aplausos calorosos, da Presidência, o Ministro pedia silêncio!


PELO VOTO EM BRIZOLA NETO E LINDBERGH FARIA


Brizola Neto - Lindbergh: compromisso com a
 Educação em tempo integral para todos 
Poderia eu agora silenciar? Não. Em que pesem as dificuldades impostas por esse sistema eleitoral, convoco os brizolistas a votar em Brizola Neto. A eleição dele não será fácil nessa legenda de aluguel do PDT. Sempre arranjam candidatos “momentaneamente populares”, completamente contra nosso pensamento trabalhista e brizolista. Para exemplificar 1/3 da bancada federal eleita na última eleição deixou o PDT. Na bancada estadual foi semelhante. 

Brizola Neto tem muito ainda por fazer em defesa dos trabalhadores e de nosso país. Precisamos marchar juntos com ele agora para conquistar melhores dias. Não podemos nos isolar, pois isso não nos faz mais verdadeiros, só nos faz mais fracos. Mas não podemos também nos diluir: para servir melhor ao povo brasileiro, precisamos manter nossa identidade brizolista e trabalhista. 

Isso está muito longe do que costumam fazer os pedetistas que têm, através de acordos, participado de governos de coalizão: ou se diluem e acabam por ingressar em seus partidos, ou se vêem isolados e, mesmo presentes em governos que se comprometeram com algum projeto brizolista, descobrem ao final que não se concretizou na prática até a simples proteção ao funcionamento das escolas de tempo integral – os CIEPs.

Precisamos estabelecer alianças programáticas com base em princípios, não em negócios. Não somos petistas, muito menos peemedebistas. E, sobretudo, não aceitamos compactuar com o elitismo entreguista do PSDB ou do DEM, como jamais aceitaríamos colocar um estado laico em projetos religiosos.

Por isso, aqui no Rio, não vacilo também em indicar o nome de um jovem marcado pela defesa de ideais libertários para Governador do Estado. Com ele estabelecemos as bases para uma frente popular de esquerda para enfrentar o descalabro do Governo Cabral-Pezão. 

Lindbergh assumiu o compromisso público com a recuperação dos CIEPS, com o enfrentamento da violência policial, com a clareza de que só a EDUCAÇÃO EM TEMPO INTEGRAL PARA TODOS pode mudar o Brasil. É um grande passo a frente, como ainda é importante a permanência de Dilma na presidência nessa difícil conjuntura internacional, evitando um retrocesso político inaceitável para o País.

Comparecemos assim à sua presença, eleitor brizolista, ou jovem eleitor do Rio de Janeiro, que nem conheceu Brizola, ou só soube dele e dos grandes líderes trabalhistas através de uma mídia ocupada em desmerecer com mentiras a história das lutas e conquistas do nosso povo, para dizer que contamos com você para resistir aos ataques aos direitos dos trabalhadores no Congresso e continuar a saga trabalhista por um Brasil soberano e justo com seus filhos.


Vamos em frente de cabeça erguida na TRILHA TRABALHISTA.

Eduardo Costa

quinta-feira, 24 de julho de 2014

ARIANO SUASSUNA IMORTAL

MOVIMENTO ARMORIAL IMORTAL


Era a Guerra. Nas ruas de Natal e do Recife começavam a ser vistos os "mariners" americanos.

Naquele ano de 1942, Ariano com 15 anos chega no Recife depois de viver 12 anos em Taperoá, no interior da Paraíba.  Sim, conversamos sobre a sua fonte de referência, aqueles tempos de sertão, tudo que se lembra depois da morte de seu pai. Foram anos crescendo com a convivência sertaneja, quando se muda da Paraíba, onde seu pai fora Governador de 1924 a 1928. Nascido, pois, filho de Governador, em 1927.

Estava agora se mudando para a cidade onde o Governador João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque, que sucedera a João Suassuna, fora assassinado em 1930. Por coincidência, seu pai também se chamava João Pessoa – João Pessoa Suassuna, que foi morto no Rio de Janeiro, naquele ano também, provavelmente por suspeitarem que estava envolvido na morte do adversário político, quando Ariano tinha três anos idade; por isso a família foi para o interior. Estudaria direito no Recife, quando começaria a se envolver com o teatro.

Aquela noite de sábado de Carnaval no Recife, para além da densa memória do personagem e sua casa avarandada em Casa Forte, tornava-se inesquecível.

Ariano jovem.
Era fevereiro de 1967.

Ciro* e eu, vimos o colega Nilton Arnt desembarcar no caminho, em Salvador. Continuamos até Recife. Fizemos amizade com o comissário de bordo – o Gilberto – e decidimos nos hospedar, como ele, no Hotel Boa Viagem durante o carnaval. 

Era noite de sexta-feira.  Na quarta de cinzas teríamos de começar nosso estágio – iríamos para Palmares. Éramos médicos recém-formados, migrantes às avessas, que se dirigiam à Amazônia.

No sábado, pelo catálogo, achei o Oscar Coutinho Neto, a quem eu conhecera em Porto Alegre depois de um congresso de estudantes de medicina e liguei para ele.  Oscar ficou feliz com os visitantes e marcou para nos apanhar para o “corso” à tarde.  Era o carnaval de rua em que a brincadeira era melar uns aos outros com lama. À noite planejávamos ir a um baile azarar as gurias. Mas o Oscar insistia em nos levar numa festa na casa de Ariano, seu parente. Um pouco contrariados fomos, mas não sabíamos ainda que Ariano era esse.

Quando chegamos na casa buzinando, o personagem nos recebeu vestido de cáqui e sandálias de couro dando tiros de espingarda para os céus. Era o Suassuna! - o cara do Auto da Compadecida, que afinal louvávamos como estudantes de um tempo de CPC da UNE, da cultura popular brasileira.

Ao saber que éramos jovens médicos sulistas que iam estagiar em Pernambuco, mas tinham o destino da Amazônia, se empolgou, chamou a mulher para explicar cada quitute servido na mesa. Falamos de Brizola e Arraes, exilados pela ditadura militar. E nos contou histórias de gaúchos e pernambucanos por um bom tempo.  Numa delas, o gaúcho com um facão arrotava para o pernambucano, que de um golpe fazia um talho tão fundo que acabaria com o cabra. - É sô, nóis aqui só usamo essa faquinha, mas fazemo tanto furinho que não sobra vontade do valente levantá o facão.

E falamos de futebol, do Inter de Porto Alegre e do Sport do Recife. Recomendou o baile do Sport no Clube Internacional. Foi o que fizemos no dia seguinte.

Já passava da meia-noite, a festa familiar começava a arrefecer, quando na varanda, sentados no chão, ele nos contou sobre seu último trabalho – o livro que escrevia, e demonstrava claramente achar que seria um marco na literatura nordestina.

Ariano nos contaria de sua vida e de suas pesquisas sobre a cultura popular que o levaram a criar o movimento armorial nordestino, numa fusão ibérico-sertaneja. O livro em que desenvolvia o tema e que estava a escrever se chamaria o Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta, que se tornou um clássico.

Em 1971, pude tê-lo às mãos, quando já morava no Rio. Mas eu já sabia a estória… explicava orgulhoso a amigos, contando sobre o narrador-personagem Quaderna.

Era o Ariano de 39 anos de idade, de cáqui e sandália, com a espingarda na mão!  Esse, só morre quando eu morrer.

______________________________
* Nota - Ciro de Quadros, faleceu recentemente em Washington, aos 74 anos de idade, com direito a necrológico no Washington Post e New York Times. Personagem importante da saúde pública mundial.


Eduardo de Azeredo Costa

Rio, 23 de julho de 2014.

sexta-feira, 9 de maio de 2014

GETÚLIO POR TONY RAMOS

QUEM QUERIA QUE O MAJOR VAZ E NÃO LACERDA MORRESSE?

Observações e Contradições.


Acabei de ver o filme de João Jardim sobre os últimos dias do Presidente Getúlio Vargas. Independente das qualidades cinematográficas e dos atores e atrizes (Drica Moraes arrasa como Alzira) e mesmo do cenário do palácio do catete, o drama de Getúlio está pouco marcado por se valer apenas de imagens de seus sonhos e poucas expressões de desgosto, como era seu estilo, em relação a opositores e colaboradores que de forma variada o decepcionavam.

Naquele mesmo palácio vi a peça de Aderbal Freire Filho, com Paulo José, e depois Othon Bastos, como Getúlio, Domingos de Oliveira e o próprio Aderbal como Benjamin, com maior liberdade para criar um clima da época.

A questão que me assaltou, no entanto, é outra: como o público que não viveu aqueles dias, nem leu Helio Silva, Rubem Fonseca e José Augusto Ribeiro, entre outros, decodifica historicamente aquela obra que pretende uma certa neutralidade narrativa, ainda que de dentro do palácio?

Sabem os mais jovens quem era o Brigadeiro Eduardo Gomes, por exemplo? As rápidas passadas por temas bastante profundos só se impregnam da história para quem a conhece.

Getúlio bota a mão no petróleo brasileiro.
Terá o domínio do “mar de lama”, construído sem contestação, deixando apenas perguntas sem resposta (Maneco Vargas vendeu ou não uma fazenda para Gregório?) e o sentimento de Getúlio ser traído por seu fiel Gregório, dando um prato cheio para a oposição, o sumário histórico pretendido daquele momento?

Quem, que não leu, pode associar a campanha pelo Petróleo é Nosso e a criação da Petrobrás em 1953, quando nosso exército já estava atrelado pela guerra ao exército americano e aos desígnios do Pentágono, àqueles personagens entreguistas, como eram identificados?

Notas de Getúlio em que registra a sua decisão
na última reunião ministerial.
O conteúdo político da carta-testamento é esvaziado no filme, e há um ausência histórica difícil de se esquecer; onde está o presidente nacional do PTB, ex-ministro do trabalho, João Goulart? Ele não só recebeu a carta-testamento de Getúlio com as instruções de não abri-la antes de chegar em Porto Alegre, para onde iria, tendo voltado do aeroporto, como se tornaria o herdeiro político de Getúlio, e nem nas notas finais, mesmo aparecendo ao lado do caixão, constou que seria eleito Vice-presidente da República.

Mas, sem dúvida, a altivez e o sacrifício de Vargas, durante todo o filme comprovam: não é qualquer um que se torna um estadista, capaz de construir as bases de uma nação. 

O filme vem em boa hora para suscitar o debate esclarecedor. Com tutores é uma obra que ajudará a falar da história do Brasil nas escolas.


O “Atentado da Toneleros” e a “República do Galeão”

Independente do filme, mas suscitado por ele, há perguntas e dúvidas que não têm sido exploradas, em particular sobre o atentado da Toneleros.

A primeira e mais óbvia é: o que fazia o major da aeronáutica Rubem Vaz que estava com Lacerda, um simples jornalista virulento anti-governo, como se fosse sua guarda pessoal? E logo, como um militar assassinado fora de serviço suscita um inquérito que invade um palácio presidencial? 

Ora, oficiais da aeronáutica se revezavam acompanhando Lacerda, como se fossem ajudantes de ordem - o golpe estava em marcha.

Com os amigos Alexandre Silla e Trajano Ribeiro, ouvimos e debatemos com o delegado Jorge Pastor, responsável pela investigação do crime da rua Toneleros, contradições incríveis, as quais muitos mais velhos ainda lembram, mas que não são sequer sugeridas no filme.

Lacerda com a perna engessada na noite do atentado.
(gravata preta, calça sem sangue)
Carlos Lacerda com o apoio de sua gangue, certamente simulou que levou um tiro na perna! Ora, segundo o delegado ele declarou que foi levado de imediato para o Hospital Miguel Couto, onde foi engessado. Mas ninguém tirou o gesso para um exame pericial. Não encontrou o delegado um registro no Miguel Couto de seu atendimento, raio-X e laudo.

Lutero Vargas que era médico ortopedista, e certamente tinha amigos no Miguel Couto, perguntava: mas como um tiro no pé de uma pistola 45 não faria um estrago que não precisasse uma cirurgia? 

E nós médicos, sabemos muito bem: NÃO SE ENGESSA EM CIMA DE FERIMENTO PELO RISCO DE INFECÇÃO (GANGRENA!)– nenhum plantonista o faria! 

Quando o delegado Pastor quis avançar nas investigações, pedindo a arma de Lacerda para exame, esse ficou indignado e pediu para tirarem a polícia do caso: tudo foi passado para a aeronáutica. 

Mas há mais: a necrópsia do Major Rubem Vaz revelou que ele levou dois tiros certeiros no coração que se cruzaram no tórax, ou seja sua morte não foi acidental tentando matar Lacerda, duas pessoas atiraram nele de perto para tamanha precisão. É improvável a hipótese do primeiro tiro ter feito ele rodar 180 braus e assim o segundo cruzar no mesmo ponto. A perícia teria de mostrar que ua bala entrou pelo peito e a outra pelas costas. E ele estava desarmado, segundo a investigação teria deixado a pistola 45 no porta-luvas do carro - nunca periciada. Mas a “República do Galeão” tomou conta de tudo para dar a versão que os golpistas queriam.

Gregório que chegou a alegar ter assinado confissões dopado, passou para a história como um pobre coitado, um cão fiel que mata para proteger o patrão, mas assim o condena. E isso foi pouco, e conveniente, depois do suicídio. Os quebra-quebras advertiam os militares, que tentariam impedir a posse de Juscelino e Jango, mais tarde!

Mas porque queriam matar o Major Vaz e não Lacerda em agosto de 1954? Haveria entre os golpistas quem não vacilaria em matar um inocente para simular uma atentado capaz de derrubar um governo? Quem tinha tamanho mau caráter?


Eduardo de Azeredo Costa

8 de maio de 2014.

quarta-feira, 12 de março de 2014

CARTA AOS PEDETISTAS DO RIO


Em 13 de março de 2014 - 
A propósito das eleições para Governador do Rio de Janeiro.
Comício da Central do Brasil de 13 de março de 1964
Há 50 anos o Rio de Janeiro assistiu um dos mais memoráveis comícios de sua história política. Na Central do Brasil, em evento protegido pelo Exército Brasileiro, pelo menos 150 mil pessoas ouviram do Presidente João Goulart as iniciativas que tomava no caminho das Reformas de Base, inclusive a reforma agrária e a reforma urbana, que preparariam o país para o crescimento harmônico e sustentado.
Brizola acena ao ser ovacionado no Comício da Central
O comício foi usado pela direita brasileira, com o apoio dos Estados Unidos da América, para efetivar o golpe militar alguns dias depois. Leonel Brizola, que sobreviveu ao mais longo exílio da história política brasileira, estava presente, armado, por saber que era alvo dos fascistas do país.
Na re-democratização consentida, com salvaguardas aos golpistas, torturadores e instituições que os apoiaram, a manipulação, o medo e a cumplicidade de oportunistas não permitiriam que houvesse outro presidente trabalhista no Brasil.
Os presidentes trabalhistas, Vargas e Jango, falavam para o povo fora do período eleitoral. Os presidentes atuais falam para os investidores estrangeiros ou para o "mercado".
Click aqui para ouvir dois minutos do discurso de Jango na Central
Mas, Brizola volta com o trabalhismo entendido por ele, em Lisboa, como o caminho brasileiro para a construção do socialismo em liberdade. E, apesar da fragmentação do trabalhismo imposto na transição, se torna a razão histórica que deu vida ao Partido Democrático Trabalhista e o líder que nos conduziu, com coerência e coragem, sempre ao lado dos anseios do povo brasileiro e na vanguarda política do país.  A sua ausência foi sentida por nós pedetistas como a mais intensa e indestrutível das presenças!
É lamentável a crise no PDT: passados quase dez anos da morte de Brizola - a falta da referência daquele norte que ele simbolizava - tornaram mais difíceis nossas decisões e ainda mais difíceis os nossos consensos. Recentemente perdemos 1/3 de nossa bancada federal, agora reduzida para 18 deputados.

É absolutamente natural e comum que existam tendências e grupos que pensem estratégias políticas diferentes e que, portanto, disputem a maneira de conduzir um partido e a realização de seu programa. Respeitar as divergências é a chave para o convívio democrático, é a chave para o crescimento de um partido. Mas, o respeito a regras democráticas consensuadas é imprescindível para a união na diversidade. Assim sendo, o horizonte do debate, bem como os seus limites, são a democracia interna e o programa do partido. 
No nosso caso, a situação é complicada do ponto de vista do processo democrático. Mas, ao programa ao qual aderem todos, se soma um patrimônio trabalhista inestimável, que podemos chamar de “legado brizolista”. Trata-se da memória viva, das corajosas posições que Leonel Brizola assumiu em favor do povo brasileiro em tantos momentos cruciais da história do Brasil, oferecendo inclusive a própria vida. Brizola retomou após o Golpe de 64 o ideário de Getúlio e Jango. 
É com esse programa e esse legado que contamos neste momento em que enfrentamos um quadro preocupante no estado do Rio de Janeiro. O apoio incondicional e a aliança política que a direção do PDT estabeleceu com o Governador Sérgio Cabral podiam ser entendidos há alguns anos; hoje queremos compreendê-los, pois temos clareza que não há nada mais antagônico ao programa do PDT do que a prática do Governo Cabral. Na antevéspera de um processo eleitoral, parece inoportuno manter o partido atrelado a um projeto político elitista e sanguinário, que implementa uma política de segurança violadora dos direitos humanos, que inverte prioridades agravando o problema da mobilidade urbana e abandona a inegável contribuição brizolista para o desenvolvimento e universalização da educação e da saúde pública.
Nós queremos dizer que respeitamos os quadros partidários que prestam seus serviços no Governo Estadual, e tendem a apoiar o candidato do PMDB ao governo, mas queremos convocar todos os bravos brizolistas que ainda compõem o PDT do Rio para cedo despertar, como nas madrugadas trabalhistas a que nos levava Brizola ante o busto de Vargas, onde líamos a carta-testamento.

Fazemos um apelo aos companheiros num clima elevado para que revejam, pois, essa posição. Por fragilidade eleitoral, está também descartada uma candidatura própria. Por essa razão, mais do que nunca, devemos procurar, no grave momento pelo qual passamos, com milhões de pessoas insatisfeitas, que se manifestaram nas ruas em uníssono contra esse governo estadual, uma candidatura de esquerda que se comprometa publicamente com um programa mínimo na educação, na saúde e na segurança pública, que Vargas, Jango e Brizola subscreveriam.

Essa posição será bem entendida pelos trabalhistas e brizolistas dispersos, pelos simpatizantes e eleitores do velho PDT de Brizola, que tantas vitórias nos deram. Sobre ela reconstruiremos um partido capaz de viabilizar candidatos majoritários para oferecer ao eleitorado do Rio num futuro próximo.

Assinam: ex-Ministro Brizola Neto e ex-Secretário Eduardo Costa.