segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

ESTRATÉGIAS PREVENTIVAS: O CASO DO AMIANTO NO BRASIL

(Homenagem científica a Geoffrey Rose)

Introdução:

O desbravador da cardiologia preventiva no Brasil, professor Aloysio Chechella Achutti, lembrou-me que em novembro desse ano estávamos celebrando os 20 anos da morte de Geoffrey Rose.

Geoffrey Rose foi o orientador de minha tese de PhD em Londres, do que me orgulho. Professor brilhante, crítico agudo das fraquezas das evidências de artigos científicos publicados nas mais renomadas revistas médicas, deixou para os epidemiologistas uma revisão de conceitos de risco e de aplicação dos mesmos em pessoas e populações, que o tornaram um dos mais notáveis epidemiologistas do mundo, ao fazer a ponte técnica entre clínicos e sanitaristas.

Geoffrey Rose
Para homenageá-lo, pouco após seu falecimento, publiquei nos Arquivos Brasileiros de Cardiologia (Arq.Bras.Cardiol., 62 (5), 289-295, 1994) uma Conferência sobre “Qual a Prioridade: Baixo ou Alto Risco Cardiovascular? – Uma Homenagem Científica a Geoffrey Rose”. Essa Conferência encerrei com palavras de Geoffrey Rose em seu artigo “Strategy of Prevention: lessons from cardiovascular diseases” (BrMedJ, 282, 1847-1851, 1981), que mantém sua atualidade:

“…Nós temos uma responsabilidade pessoal com a prevenção, tanto na pesquisa como na prática médica. Quando os médicos não aceitam essa responsabilidade, a prevenção é assaltada por propagandistas acríticos, por impostores e por interesses comerciais escusos.”

Sinopse explicativa:

Em 2012, o Ministro do Trabalho e Emprego, Carlos Daudt Brizola, me designou para representar o ministério numa audiência pública no Supremo Tribunal Federal, sobre uma ação de inconstitucionalidade de lei estadual que proibia o uso do amianto no estado de São Paulo. Outros estados também têm essa lei, mas nada existe a nível federal. Após essa audiência foram proferidos dois votos: o Ministro Carlos de Britto antes de se aposentar votou a favor das leis estaduais e o Ministro Marco Aurélio contra as mesmas. Pelo óbvio e incessante envolvimento do Supremo com o caso conhecido como Mensalão, até hoje não ocorreram, creio, outros votos.

Naquela audiência, a minha apresentação, datada de 24 de agosto, homenageou Getúlio Vargas, mas foi baseada exatamente no trabalho de Geoffrey Rose. Para a mesma, vários colaboradores contribuiram com dados.

As apresentações de alguns professores e outros, inclusive representantes de outros ministérios, foi lamentável por demonstrar completo despreparo metodológico e singular viés pró-indústria: impossível não lembrar de novo Geoffrey Rose na frase da introdução.

Argumento central: ocorrem mais casos entre os de baixo risco!
A indústria do amianto no Brasil quer reduzir os casos de mesotelioma com a melhoria do controle nas fábricas, onde o risco individual é alto: 100 vezes maior do que na população geral. Ou seja, uma estratégia de alto risco. Confrontei esse dado, não só com a precariedade do controle nas fábricas, mas com o risco coletivo: na população geral que tem risco relativo tão menor, ocorrem 100 vezes mais casos. Quer dizer, ocorrem mais casos entre os que tem mais baixo risco! A única estratégia para acabar com a maioria dos casos é a proibição total do uso, comercialização e produção do amianto no Brasil, como outros países o fizeram. A força demonstrativa do argumento de Geoffrey Rose causou um impacto considerável. Esperamos que afete os votos dos demais ministros. Mas, se alguém me perguntar porque uma medida provisória ou uma lei do congresso não faz isso, só posso responder que nessa forma de democracia, os interesses privados de multinacionais estão acima dos interesses da saúde.
Para ilustrar, essa publicação anexa o conjunto de diapositivos que utilizei e o link do vídeo da exposição no STF. http://www.youtube.com/watch?v=jBpOuQbimo0

 Slides - http://www.slideshare.net/eduardodeazeredocosta/audincia-pblica-sobre-o-uso-do-amianto

*Eduardo de Azeredo Costa, 30 de novembro de 2013.

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